A compra de ouro pelos Bancos Centrais atingiu no primeiro semestre de 2023 o maior nível já registrado, enquanto cresce o debate sobre uma “desdolarização” global, revelam dados do Conselho Mundial do Ouro.
A demanda chegou a 387 toneladas, sendo a maior desde o início da série em 2000. Isso acontece após um recorde anual de 2022, quando 1.083 toneladas entraram nos cofres dos BCs.
Sozinha, a China respondeu por 103 toneladas de compra entre janeiro e junho de 2023. O Banco Central de Singapura foi o segundo maior comprador durante o primeiro semestre, adicionando 73 toneladas, seguida pela Polônia, que comprou 48 toneladas.
A tendência continuou forte em julho e agosto, segundo dados coletados pelo Dinheirama. As compras por BCs no período somaram 114,3 toneladas. China, Polônia e Turquia lideraram as aquisições.
Demanda no primeiro semestre de 2023 é a maior já registrada para o período
Desdolarização
Para Maxwell Gold, chefe de estratégia do ouro na State Street, as razões que motivam as compras de ouro pelos Bancos Centrais — como diversificação das suas reservas, melhora dos seus balanços e liquidez a partir de um ativo sem risco de crédito — provavelmente não mudarão, dados os crescentes riscos econômicos e geopolíticos de hoje.
“Portanto, ao olharmos para o futuro, esperamos que os BCs continuem o seu papel como compradores líquidos de ouro”, acrescentou Gold em uma nota, segundo o Business Insider.
Em 12 meses, o preço do ouro (USD/OZ) disparou 9,78%, enquanto o índice dólar (DXY) acumula uma queda de 6,2%.
“O preço do ouro tem apoio em uma série de fatores, incluindo uma fraca recompensa de risco para as ações, aumento do risco de recessão ao longo dos próximos 6 a 12 meses, volatilidade da inflação e compras dos bancos centrais”, disse Jeremy De Pessemier, analista do Conselho Mundial do Ouro, em uma nota divulgada nesta terça-feira (10) obtida pelo Dinheirama.
O ouro foi a base da economia capitalista por centenas de anos até o abandono do padrão-ouro, que levou à expansão do sistema da moeda fiduciária no qual o papel-moeda não tem lastro em bens físicos como forma de monetização.
BRICs
Em meados de setembro, os BRICs debateram em uma reunião de cúpula a adoção de outra moeda de referência para as transações entre os membros.
A movimentação chega em um contexto em que a China lidera o protagonismo no bloco, recém-ampliado para acomodar Arábia Saudita, Argentina, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã, além do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
As novas adições tornam o grupo uma potência na produção e comercialização de petróleo, chegando a 42% (de 20% na composição anterior).
“Dadas as ambições dos BRICs de desdolarização, haverá certamente uma especulação crescente de que este último movimento poderá levar a Arábia Saudita a mudar cada vez mais para moedas não denominadas em dólares para o comércio de petróleo”, analisa Chris Turner, chefe global de mercados do banco ING, em um relatório obtido pelo Dinheirama.
Pode fazer sentido, por exemplo, que a Arábia Saudita comece a aceitar o iuane chinês e a rupia indiana da China e da Índia para o seu petróleo bruto. A mudança também pode acontecer em uma expansão do que já é feito nas negociações de petróleo entre o Irã e a China, que já trocam o produto em iuanes devido às sanções dos EUA.
Há ainda uma importante verdade abaixo de todas essas discussões. O rial saudita está indexado ao dólar a US$ 3,75 desde a década de 1980.
“Se os sauditas começarem a desdolarizar a sua economia através do aumento das receitas em moedas que não sejam o dólar, os investidores poderão começar a questionar se ocorrerão mudanças na paridade — por exemplo, a taxa de câmbio. O rial deveria ser administrado em relação a uma cesta de moedas e não apenas em relação ao dólar?”, pontua Turner.
Sanções
Outro fator que advoga a favor da tendência de “desdolarização” é a fuga das sanções internacionais aplicadas pelos EUA contra o Irã em 2015 e à Rússia em 2022.
Banidos do sistema SWIFT, de pagamentos internacionais, a busca por alternativas, como o ouro, tornam-se atraentes.