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O empreendedor resiliente também sabe desistir

by Cristina Pizarro
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Dizem que o empreendedor (sobretudo o pequeno) deve ser maduro, focado, persistente. Deve ser visionário, enxergar oportunidades, ser um bom líder, saber operar todos os processos de sua empresa, ser benevolente, contribuir para a sua comunidade, estar por dentro de tudo sem ser invasivo e por aí vai.

Uma lista interminável de “qualidades” que fazem com que tenhamos de ser quase super heróis da vida real. Sem esquecer da onipresente “resiliência”. Acredito que, quando interpretada erroneamente, a tal resiliência pode ser uma armadilha que nos impede de perceber quando um ciclo deve se encerrar dignamente.

Partir pra outra. Sim, o seu empreendimento não é um casamento do passado, uma prisão sem direito a divórcio. Você pode, e por vezes deve, deixá-lo pra trás, fechar as portas e recomeçar. Não do zero, porque todos os dias aprendemos algo. Chega dessa infantilidade de “meu sonho”, caro empreendedor.

Leitura para empreender: “Quebre a Caixa, Fure a Bolha” (clique)

Empreender não se faz dormindo, se faz acordado, e bem acordado. E a tal resiliência pode ser só teimosia disfarçada em uma palavra mais bonita.

Se há uma coisa que o empreendedor deve saber fazer é encerrar ciclos. Sei que é difícil. Cada pedacinho daquela loja tem um valor sentimental. Só nós sabemos o quanto foi difícil colocar o gesso naquele cantinho. Quanto custou aquele ar condicionado. O quanto fomos roubados, processados e mantivemos a cabeça erguida.

Cada vitória foi uma vitória pessoal. A cada derrota – e foram muitas – conseguimos forças e empréstimos para recomeçar. Então, quando sentimos que o negócio já se esgotou, temos muita resistência em abandonar o barco. Afinal, o capitão deve ficar no leme, né? Firme, ser exemplo e acreditar sempre. Balela de quem nunca empreendeu.

Já contei em outras ocasiões que fui franqueada de uma grande rede por 15 anos. No início, foi ótimo. Depois bom, depois ruim, depois péssimo, depois quase insuportável. O negócio mudou? Sim, mudou bastante, mas quem mais mudou fomos nós, os proprietários.

Sempre soubemos que não seria um empreendimento para envelhecer operando. Muitas regras, pouca autonomia e margem apertada fazem com que o empreendedor maduro não queira mais se submeter. Mudou a rede, mas sobretudo mudamos nós. Hora de encerrar a parceria e deixar com que outro novo empreendedor seja feliz e aprenda.

É triste, é um fracasso, foi um tempo desperdiçado? Não, de forma alguma. Essa é uma mentalidade muito antiquada, de quando as pessoas desejavam entrar em uma empresa e ali ficar até a morte. O mundo não é mais assim, e as carreiras não são lineares. É bom que assim seja.

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A pandemia que vivemos acelerou a reflexão e a tomada de atitudes de vários empreendedores. Vou te contar dois casos próximos.

Um é meu vizinho de loja. Tem uma papelaria e loja de miudezas e doces há 19 anos no mesmo local, próximo a uma escola. A escola já vinha com muitas greves, paralisações, dias sem aulas e, consequentemente, minguando a quantidade de alunos. A gurizada que antes lotava a loja comprando balas, lápis e cartolinas foi sumindo. Com a pandemia, desapareceu.

O Elias e sua esposa já tinham percebido, como empreendedores experientes que são, que não valia mais o esforço de trabalhar treze horas por dia. Longe da filha, almoçando marmita, pagando impostos e fornecedores. Depois de muita reflexão, chegou a hora de encerrar o ciclo. Derrota? Nem perto disso.

Transferiram o estoque para a outra papelaria que tinham em um cômodo de sua casa, se livraram do aluguel e abriram uma padaria ao lado de casa. Agora estão mais próximos, mais felizes e com o ânimo renovado para seguir empreendendo. Sem lamentações contra governo, contra preço de aluguel, nada. Simplesmente faz parte da vida do empreendedor a mudança.

Outra é uma amiga que tem um estúdio de Pilates incrível aqui na cidade. É uma empreendedora muito inteligente e ousada. O estúdio é enorme. Além do negócio físico, é uma influenciadora digital importante na área.

Cenário pandemia, tudo fechado. O que fazer? Chorar, reclamar, ficar nas redes sociais compartilhando centenas de posts? A resposta foi: refletir e antecipar o encerramento do ciclo. Entregar o ponto comercial não com sentimento de derrota.

O cenário fez com que ela enxergasse que em sua casa havia um espaço enorme que poderia ser reformado e ficar até melhor que o anterior. E foi isso que fez. São exemplos simples, de pessoas simples, que vivem desafios diários que todo o empreendedor ou prestador de serviços vive. 

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Resiliência é “a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica”. Como não somos materiais, mas sim seres humanos em constante formação, não precisamos “voltar à forma original”.

Devemos ser resilientes no sentido figurado. Na capacidade de se adaptar facilmente às circunstâncias. Só que se adaptar, às vezes, significa fechar as portas e partir para outra. Caro empreendedor, você está pronto?

Foto: Pexels.

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