O superávit comercial recorde do Brasil impressionou em 2023, mas deve ser difícil de se repetir à frente, afirmaram economistas e autoridades do governo, prevendo que a queda nas taxas de juros impulsionará as importações.
O desempenho robusto dos setores de petróleo, minério e do agronegócio pavimentou o caminho para um excedente comercial que saltou ao longo da última década, passando a diferenciar o Brasil dos seus pares regionais.
No entanto, o superávit do ano passado cresceu mais de 50% em relação a 2022, para quase 100 bilhões de dólares, em grande parte devido a uma queda de 12% nas importações, uma vez que o valor das exportações ficou quase estável.
Essa dinâmica deverá mudar este ano, dizem os analistas, embalada por uma recuperação dos investimentos, que tiveram performance sofrível em 2023.
Alguma reação é agora prevista em meio ao ciclo de afrouxamento monetário e a um maior ímpeto do setor privado na esteira dos investimentos públicos já sinalizados pelo governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para obras de infraestrutura.
Lula, que também busca fazer da multiplicação dos canteiros de obras uma vitrine para o Partido dos Trabalhadores (PT) nas eleições municipais deste ano, assinalou em outubro que não seria necessário cumprir a meta de zerar o déficit primário em 2024 dada a importância de assegurar financiamento para projetos prioritários.
Os dados da última década mostram que os investimentos fixos e as importações no Brasil usualmente caminham lado a lado. No terceiro trimestre, a Formação Bruta de Capital Fixo registrou sua quarta queda trimestral consecutiva, uma sequência observada pela última vez no início de 2016, quando o Brasil enfrentou uma das piores recessões da história.
A queda nas importações em 2023, juntamente com volumes mais fortes de exportações agrícolas e minerais que compensaram os preços mais fracos, elevaram o superávit comercial do Brasil para um novo e vultoso recorde. Isso ajudou a reduzir o déficit em conta corrente nos 12 meses até outubro para 1,62% do PIB, o mais baixo desde fevereiro de 2018.
“Me parece explicação importante, relevante e pouco debatida que a melhora do saldo comercial seja um reflexo também do baixo dinamismo dos investimentos”, afirmou Gilberto Borça Jr., pesquisador associado do FGV Ibre.
Mesmo que os investimentos não aumentem drasticamente, é provável que se recuperem em 2024, acrescentou ele, o que também deverá elevar as importações.
Uma fonte do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), que pediu anonimato para discutir as previsões internas, afirmou que o governo não considera o nível do superávit comercial de 2023 como estrutural.
De um lado, a exportação está sendo sustentada pelos volumes mais altos, e é difícil manter esse ritmo de crescimento indefinidamente. “Na medida em que a taxa de investimento no Brasil começar a crescer, a importação também deverá crescer”, adicionou.
Depois de um ano marcado por altos custos de financiamento, a indústria brasileira também espera um ambiente mais favorável em 2024 devido às taxas de juros mais baixas, disse Igor Rocha, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Após manter a Selic no nível mais alto em seis anos para conter a inflação, o Banco Central iniciou um ciclo de flexibilização em agosto e já reduziu sua taxa básica em 2 pontos, para 11,75%, sinalizando novos cortes no futuro.