Juliano comenta: “Navarro, vivi na pele um dos problemas que você tanto fala em relação ao dinheiro. Sem reserva nenhuma, perdi o emprego e demorei quase seis meses até conseguir um novo trabalho. Acabei tendo que entrar em uma vaga inferior à que eu estava e vou demorar um pouco mais para voltar ao patamar anterior. Achei importante fazer o alerta porque outros leitores devem viver situação semelhante, não? Abraços”.
O problema das emergências é que elas acontecem, mas são imprevisíveis. No sentido financeiro, no entanto, a realidade não é tão aleatória assim. Muitas situações complicadas de endividamento e emergências financeiras acontecem em decorrência do descontrole, da falta de interesse e do modo carpe diem de viver a vida, tão na moda hoje em dia.
Tome, por exemplo, a chegada do fim de ano e sua virada, com tudo o que envolve esses períodos. Festas, Natal, Réveillon, Viagens, Férias, IPVA, IPTU e material escolar, não é isso o que vem à sua cabeça? Despesas, despesas e mais despesas. Mas não é assim todo santo ano?
O resultado do exemplo acima é quase sempre o mesmo: o 13º Salário quase não serve para nada, as compras de Natal e a viagem de Réveillon são pagas com crédito (ao melhor estilo “No ano que vem pago isso”) e o orçamento familiar é simplesmente ignorado.
Chega janeiro e o dinheiro acaba, enquanto as dívidas aumentam e com ela os níveis de angústia e ansiedade. O IPVA por pagar é parcelado e mais dinheiro emprestado é usado para “manter a roda girando”. O cidadão desanima, “chuta o balde” e passa a reclamar de tudo, sem admitir sua responsabilidade. A vida continua. Amarga, mas continua…
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O “piloto automático” da vida custa caro
Se sempre acontece o que descrevi nos parágrafos anteriores, por que é que todo ano sofremos com isso? Se sabemos que no ano que começa a situação vai se repetir, por que não fazemos diferente e evitamos os mesmos problemas? Porque falta interesse e atitude associados ao planejamento financeiro.
Mais do que isso, falta definir melhor os limites do orçamento familiar e estabelecer prioridades para os próprios recursos. Viver a vida no “piloto automático” significa consumir sem questionar e reagir em vez de agir, o que termina em sonhar sem capacidade de realizar.
Pois é, “piloto automático” é o que fazemos quando temos problemas e simplesmente os ignoramos para manter a pose e a impressão de sucesso vista pelos outros. As convenções sociais (dar presente no Natal, sempre viajar no Réveillon e nas férias, ter carro etc.) custam caro, e não apenas em dinheiro.
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O descaso com a reserva de emergência pode arruinar a vida
“A maioria das pessoas não planeja fracassar; fracassa por não planejar” – John L. Beckley
Faz sentido colocar-se em grave situação financeira por conta da artificial necessidade de sucesso? A decisão de mostrar-se bem-sucedido (ainda mais hoje, com as redes sociais) costuma arruinar carreiras inteiras e até mesmo o relacionamento familiar. É fácil entender porquê, acompanhe.
Sem reservas financeiras de qualquer tipo, ao perder o emprego ou sofrer um revés profissional, qualquer pessoa terá que sair procurando por um novo trabalho. Qualquer trabalho. Não raro, a opção encontrada a tempo de sobreviver e manter alguma dignidade implica cargos/posições inferiores e salários mais baixos.
Em um cargo inferior, com dívidas para pagar e desmotivada, este profissional acaba se acomodando e demora para “acordar”. Muito tempo passa até que ela se dá conta de que não progrediu como poderia e que isso não ocorreu por sua responsabilidade (ou falta dela). É trágico, mas real: uma carreira inteira abreviada.
Isso sem contar nos inúmeros casos de pessoas que demoram meses para encontrar recolocação, o que força uma mudança brusca de padrão de vida, geralmente acompanhada de mais dívidas e muitos favores financeiros.
Estes, quando conseguem a recolocação, são constantemente relembrados pelos amigos e familiares sobre o dinheiro emprestado. As cobranças criam animosidades e um clima tenso, frequentemente terminando em brigas, afastamentos e até mesmo completo rompimento. É trágico, mas real: relacionamentos destruídos.
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Emergências financeiras: se quiser, você pode evitá-las
A esta altura você deve estar me achando um chato: “Poxa, precisava mesmo ser tão incisivo e afundar o dedo na ferida assim?”, posso ouvir você perguntando. Sim, precisava. Emergências financeiras são geralmente reflexos de nossas atitudes e decisões, e não necessariamente algo aleatório e totalmente inesperado.
O que eu quero dizer é que a maior parte das dramáticas situações financeiras vividas pode ser evitada. Como?
- Poupando mais. Falo de guardar parte das receitas (10% pelo menos) para construir uma reserva de emergência capaz de manter o seu atual padrão de vida por um período de 10 meses a um ano. Ao ter o equivalente a dez meses de renda em um investimento acessível, de baixo risco, você garante que em uma emergência (perda de emprego, problema de saúde etc.), haverá recursos para manter a família até que todos sejam capazes de resolver a questão;
- Conversando sobre finanças com a família de uma forma clara, honesta e constante. Eleger as finanças como uma prioridade dentro de casa é importante para que o assunto deixe de ser um tabu;
- Associando o dinheiro a coisas boas. Em vez de apoiar-se sempre no crédito para realizar sonhos e desejos de consumo, passe a valorizar mais o esforço de poupança e investimento associado ao tempo e o sabor da conquista será ainda melhor;
- Evitando a compra por impulso. Não dê ao seu cérebro a chance de querer algo a ponto de ignorar qualquer opinião contrária ou o que “diz” seu orçamento familiar. Faça isso deixando de comprar na primeira vez que ver ou tocar qualquer produto. Espere até o dia seguinte e, se você passar a noite em claro por não ter comprado, é porque precisa muito mesmo daquilo. Compre sem peso na consciência. Você verá que com 99,9% das coisas, seu sono será tranquilo e no dia seguinte você terá esquecido daquilo que queria. Ou seja, você não precisava mesmo tanto assim;
- Investindo mais em você e menos em coisas. Tudo que temos está “programado” para sair de linha, em um conceito chamado de obsolescência programada, difundido principalmente pela Apple e seus produtos lançados a cada 6 meses. Traduzindo: manter-se em dia com os lançamentos de tudo custa caríssimo e é algo bastante infantil. Prefira investir na sua formação, no seu bem-estar e nas atividades que lhe trazem progresso pessoal, familiar e felicidade.
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Conclusão
“Quando Noé construiu a Arca, ainda não estava chovendo” – Marcelo Elbaum
Emergências de qualquer natureza envolvem o inesperado, mobilizam de forma urgente a família e mudam a forma de administrar o cotidiano. As mudanças trazidas a partir de uma emergência assim podem ter caráter duradouro ou até mesmo irreversível.
A boa notícia é que emergências financeiras não precisam ser tão dramáticas nem perigosas para o futuro familiar. Eu digo não precisam porque para que isso aconteça precisamos assumir a responsabilidade de encarar o dinheiro como assunto sério que é e mudar nossa atitude em relação ao futuro.
O mais importante é começar hoje, agora, a respeitar a regra de ouro das finanças pessoais: gastar menos do que ganha. A partir dessa nova realidade, de um padrão de vida sustentável e coerente, deve-se também investir, ou seja, preocupar-se com a construção do futuro como queremos que ele seja.
Chega de esperar as coisas acontecerem e torcer para que elas não sejam tão complicadas. É hora de criar a ponte entre você e seus sonhos, e ela se chama disciplina. Emergências financeiras não combinam com disciplina. Você concorda? Deixe sua opinião no espaço de comentários. Obrigado e até a próxima.
Foto “Man asking for help”, Shutterstock.