Algum tempo atrás, recebi um telefonema de um amigo próximo, que relatava algumas dificuldades financeiras. Logo de cara, percebi que o problema não era de salário baixo, afinal tanto ele quanto a esposa recebem vencimentos que os colocam dentro do que chamamos de classe média alta.
Mesmo com salário alto, o dinheiro acabava antes da metade do mês e a família era obrigada a usar o limite do cheque especial para poder manter o padrão de vida. Infelizmente, o caso de meu amigo não é uma aberração.
Tenho certeza de que os demais educadores financeiros também já se depararam com famílias vivendo a mesma (triste) realidade. Uma lição importante já pode ser percebida aqui: quando o problema não é exclusivamente de renda (e quase nunca é!), a causa do transtorno está no comportamento e na atitude diante do dinheiro.
Por ser um amigo próximo, alguém que já esteve muitas vezes ao meu lado em situações difíceis, decidi ajudá-lo. Aproveitei e pedi autorização para, sem citar nomes, usar a sua história para compartilhar por aqui as soluções que juntos encontramos para sua transformação.
Vivi a primeira grande surpresa quando pedi para ver os controles financeiros da família. A ideia era olhar os gastos e ver para onde estava indo o dinheiro de casa, mas logo fui informado de que não existia nenhum controle.
Primeiro problema: os gastos eram feitos com base nas necessidades do dia a dia. Percebi nesse momento que o trabalho seria mais complicado do que inicialmente previra, mas ao mesmo tempo entendi que para definir o caminho seria necessário um comprometimento maior de todos (e essa união muda tudo!).
Com um pouco de boa vontade de todos, criamos uma planilha de orçamento doméstico que passou a ser alimentada sempre, não apenas para registrar os gastos, mas principalmente para fazer da ferramenta um importante elemento para tomada de decisão de consumo.
Para definir o padrão de vida da família e alimentar os controles, usamos três meses como base. Só a presença do controle e as reuniões periódicas para discuti-lo refletiram em um consumo mais organizado e, consequentemente, em redução de gastos, que caíram cerca de 30% na média, um resultado já bastante expressivo.
Enquanto definíamos o padrão de vida da família, comecei a estudar o relacionamento bancário. Meu amigo tinha conta em um banco e a sua esposa em outro, tudo por conta das “facilidades” oferecidas.
Segundo problema: além de não existirem controles, cada um tomava as próprias decisões em relação às contas correntes, sem que existisse um diálogo. Os dois estavam pendurados no cheque especial e nem desconfiavam do quanto pagavam de juros por isso.
Terceiro problema: muitos cartões de crédito e muitas compras parceladas feitas com eles. Além dos gastos com cheque especial, que aumentavam mês a mês, os gastos com diversos cartões de crédito também corroíam a capacidade de planejamento da família.
A verdade é que por ter acesso a limites altos de crédito, meu amigo ia “empurrando com a barriga” os pagamentos feitos nos cartões, sempre utilizando a função rotativa, ou sejam pagando o mínimo ou pouco mais que isso.
De acordo com dados recentes divulgados pela Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), os juros do cartão de crédito atingiram o maior nível em 16 anos, alcançando o incrível patamar de 290,43% ao ano.
Após analisar as contas correntes e o uso dos cartões com bastante cuidado, a solução proposta foi unificar as finanças do casal, concentrando o relacionamento bancário na instituição que oferecesse as melhores taxas e as tarifas de manutenção mais baixas.
A partir do consenso sobre as contas e uso dos cartões, ficou muito mais fácil para a família discutir os gastos e manter o foco nos objetivos comuns; e o primeiro objetivo era erradicar as dívidas com cheque especial e cartões de crédito, uma vez que estas representam os juros mais elevados cobrados da pessoa física no Brasil.
Se o cheque especial e o rotativo do cartão de crédito significam juros altos, seguimos com a ideia de trocar essa dívida elevada e cara por outra linha de crédito com juros mais baixos. O caminho inicial foi buscar um empréstimo consignado, linha de crédito mais em conta, que cabe como uma luva para esse tipo de situação.
Consertando os principais pontos, chegava o momento de colocar todo o planejamento em prática. Tão importante quanto sentar, conversar e planejar os passos para o futuro financeiro é arregaçar as mangas e garantir o envolvimento na busca das melhores oportunidades.
Ao bater nos bancos e discutir com os gerentes o acesso às melhores taxas, meus amigos conseguiram aprender bastante e perceberam que uma boa negociação pode promover milagres. Quando o assunto é dinheiro, mostrar-se interessado e comprometido sempre vale a pena.
Controlando receitas e gastos, definindo as prioridades de consumo, renegociando (acabando com) as dívidas e gastando com consciência, o trabalho de arrumar as finanças da família foi um momento de aprendizado e de reconquistar algo fundamental para o futuro: garantir que todos em casa caminham na mesma direção.
O processo de ajuste das finanças do meu amigo está caminhando para o quinto mês. Hoje, felizmente, a situação está completamente diferente. Dentro do planejamento inicial feito, em seis meses o casal não terá mais dívidas; até meados do ano que vem a família terá criado uma reserva para emergências que garantirá a tranquilidade da família.
4 dicas para sair do sufoco e o dinheiro chegar no fim do mês
Tenho certeza que muitos leitores passam, passaram ou ainda vão passar por uma situação semelhante à que descrevi aqui. É certo que você conhece pessoas próximas que atravessam problema semelhante.
De forma objetiva, o caminho para resolver o problema e sair do sufoco passa pelos seguintes passos:
1. Aceite que existe um problema e busque ajuda
Com o atual cenário de juros no Brasil, rapidamente uma dívida pode dobrar de valor. É fundamental olhar para essa situação não como uma vítima, mas como alguém que tomou decisões equivocadas e que agora precisa de ajuda para organizar as finanças e escolher o melhor caminho.
Você precisa mudar de atitude, inserir comportamentos adequados, mas também precisa livrar-se das dívidas e organizar as finanças, por isso não negligencie os aspectos práticos e diretos do orçamento doméstico – uma ajuda profissional pode fazer muita diferença neste momento.
O que fazer? Pesquise profissionais capazes de ajudá-lo a organizar as finanças e, mais do que isso, que ofereçam suporte para a necessária reprogramação mental para lidar com o dinheiro como uma ferramenta, não um fim. Busque ajuda!
2. Dedique parte de seu tempo para a estratégia
Não dá para ter bons resultados financeiros apenas confiando na contabilidade mental ou no bom senso. Confiar nas suas capacidades é importante, mas gastar dinheiro envolve emoção, e ai não há controle mental capaz de superar a estratégia clara e devidamente registrada.
É fundamental manter planilha, controle financeiro online ou qualquer forma de controle efetivo para servir de bússola para suas decisões de consumo – isso significa ter uma estratégia, ser proativo. Só dessa forma será possível dimensionar os gastos e traçar um plano inteligente para cortar aquilo que destrói as finanças da família e a afasta de seus sonhos.
O que fazer? Registre receitas, despesas e faça uma análise frequente deste orçamento ao lado da família. Suas prioridades precisarão se refletir neste controle, criando assim sua estratégia financeira rumo aos seus sonhos.
3. Fale sobre dinheiro em casa
Um erro grave cometido pelo meu amigo era nunca falar sobre dinheiro com a esposa. Mesmo ficando claro para os dois que existia um problema, ambos decidiam não tocar no assunto nas suas conversas em casa.
Quando isso acontece, fica praticamente impossível criar a sintonia necessária para definir e lutar por objetivos comuns, um elemento fundamental para o sucesso financeiro de qualquer família. Ao passar a adotar um controle financeiro único e compartilhado, meus amigos ajustaram os objetivos e uniram as forças para sair das dívidas.
O que fazer? Crie momentos específicos para falar do orçamento familiar e aprofunde-se nesta discussão. Além disso, elimine a barreira que envolve as finanças e passe a discutir o tema com mais naturalidade em qualquer ocasião, inclusive com gente conhecida e familiares.
4. Atenção com as palavras “crédito”, “empréstimo” e “financiamento”
Consumir usando o crédito foi algo incentivado no Brasil nos anos anteriores. Dá para dizer que vivemos uma explosão de possibilidades de consumo diante da oportunidade de milhões de brasileiros terem acesso a empréstimos e financiamentos.
O crédito era abundante (a situação mudou recentemente), mas nunca foi barato. Agora então, voltou a ficar caríssimo (os juros seguem subindo). Infelizmente, muita gente passou utilizar o limite de cheque especial e do cartão de crédito como complemento de renda, um erro grave e muito caro.
O que fazer? Você precisa ajustar o seu padrão de vida a partir dos resultados dos passos anteriores, ou seja, reduzir gastos e aprender a fazer escolhas para que o controle financeiro traga resultados e as finanças saiam do vermelho.
Conclusão
Decidir mudar uma situação delicada e passar por um processo de transformação é sempre um exercício que requer força de vontade e dedicação. Em diversos momentos, novas dúvidas, dificuldades e tentações surgirão, isso é fato! Aceitar abrir mão do imediatismo por um objetivo maior é um preço a ser pago por quem deseja alcançar o sucesso. Vale a pena!
Aqui no Dinheirama já abordamos em vários momentos o tema endividamento, veja alguns textos que contribuirão com sua intenção de sair do sufoco (clique no que desejar ler):
- 3 Atitudes capazes de mudar sua vida financeira
- 3 Atitudes para terminar o mês sem dinheiro
- Como quitar dívidas vencidas ou atrasadas
- Como acabar com as dívidas em cinco passos
- Renegociação de dívidas: trocar dívida cara por dívida barata
- Dicas para livrar-se das dívidas
Tenho certeza que sair do sufoco financeiro é algo possível para todos. Lembre-se que ganhar bem não garante uma vida livre de dívidas, conforme mostrei com o exemplo de meu amigo. Muito do sucesso financeiro depende de gastar com inteligência e apostar em bons controles para melhorarmos nossas decisões de consumo e investimento.