E passaram voando os primeiros e representativos cem dias de governo da Presidenta Dilma Rousseff. As pesquisas divulgadas há poucas semanas mostram que a população apóia o governo, mas que há um receio muito grande em relação à escalada da inflação. O fantasma dos preços altos assusta alguns brasileiros e traz de volta as discussões em torno de uma figura mítica, o Dragão. Será que ele acordou?
A inflação é, ao lado da desvalorização do dólar, um dos principais problemas do atual momento do governo. No campo inflacionário existe uma queda de braço entre o mercado, que pede maior atuação por parte do Banco Central (BC) na elevação da Taxa Selic, e o governo (leia-se Ministro Guido Mantega), que defende a preservação do crescimento do PIB perto de 5% em 2011. As palavras de Mantega convergem para a ideia de que a manutenção da política de aumento dos juros significaria a interrupção do crescimento.
Em tese, o BC aceitaria uma inflação fora do centro da meta em 2011. Em 2012, o BC acredita, ou ao menos passa a ideia, que o centro da meta, 4,5%, estaria próximo ao índice da inflação. Acontece que o IPCA (12 meses) divulgado agora mostra que a inflação já está em 6,3%: estamos saindo do sinal amarelo e entrando no vermelho.
Taxa Selic, um tiro no pé?
O aumento da Taxa Selic, apesar de ser defendido pela maior parte dos analistas e gurus do mercado, também tem seus efeitos colaterais: aumenta a dívida pública e cria dificuldades para empresas do país em manter a cadeia produtiva em funcionamento, já que encare o crédito usado como fonte de investimentos por parte destas companhias e desestimula o consumo, diminuindo o faturamento.
Acredito que o que precisamos buscar é uma forma de acabar com a indexação da economia e percebo que poucos defendem um debate mais amplo e racional sobre esse tema. O país não aguenta mais ter que recorrer sempre ao aumento dos juros para conter a inflação: o passo precisa ser dado antes, na formação dos preços.
A infraestrutura e alocação de recursos também precisam melhorar. O país tem que aperfeiçoar sua capacidade industrial e agir para que os investimentos diretos para estruturar seu crescimento saiam do papel e dos discursos.
Dólar teima em cair
Outro ponto crucial para o futuro diz respeito à pressão cambial. Medidas foram tomadas, aumentando o IOF para empréstimos aqui e lá fora, sem um resultado positivo. O dólar continua a cair e a renúncia fiscal que o governo fez ao corrigir a tabela do Imposto de Renda já foi compensada com esses aumentos: é dar com uma mão e pegar com a outra.
A “caixa de maldades” está aberta e o governo tem a faca e o queijo na mão para tomar outras medidas. A arrecadação crescente com a mudança no IOF parece ser motivo de alegria para alguns integrantes da base governista. Há quem veja na alta do IOF uma sombra da CPMF. Sendo sincero, tudo que se pede é eficiência nas medidas.
Não podemos nos esquecer dos cortes no orçamento, da ordem de R$ 50 bilhões em 2011. Um corte de despesas que ainda não foi realizado e tido apenas como manobra. As despesas correntes, ao contrário do que se pregava, aumentaram e trazem grande temor para o futuro.
A falta de estrutura para a Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas 2016
A cada dia ficamos mais próximos dos eventos esportivos de 2014 e 2016. Estamos flertando com o perigo de não termos estádios e infraestrutura mínima para acomodar e receber os turistas que virão para o evento. Um dos pontos mais críticos é a situação vexatória dos nossos aeroportos: pequenos, inseguros e despreparados para o mínimo de conforto de quem necessita viajar de avião.
Dilma “encara” as duas grandes potências
Nestes cem dias também foi notícia a viagem do Presidente dos EUA, Barack Obama, ao Brasil. Dilma mostrou firmeza nas negociações e deixou claro que o Brasil busca parceiros e não abaixará a cabeça à vontade americana. Obama entendeu o recado e percebeu que o Brasil tem muito a oferecer, mas também tem suas exigências.
Justamente no centésimo dia de governo, Dilma Rousseff estava em viagem oficial rumo à China. Nada mais representativo e importante, já que mostra a disposição brasileira de valorizar o crescimento comercial com o novo parceiro preferencial. Temos muito a negociar e, principalmente, a discutir sobre o protecionismo chinês. Tomara que com a mesma clareza que foi usada diante dos EUA.
Os cem primeiros dias ficaram para trás. Os desafios só começaram. Estamos de olho. Até a próxima.