Que o Brasil tem muitos picaretas, todo mundo sabe. Mas qual o tamanho da picaretagem realizada pelos brasileiros? Há pirataria, tráfico, negociações políticas em trocas de influência e muito mais. Mas, será que temos também fraudes no sistema financeiro? O escândalo financeiro protagonizado pelo Sr. Bernard Madoff nos Estados Unidos trouxe luz a uma antiga afirmação popular: “quando a esmola é demais, até o santo desconfia”. E se você tivesse oportunidade de investir em um clube de investimentos com retornos de 10% a 30% ao mês. Toparia? Por que? Por que não?
André, um amigo e leitor deste blog desde os seus primeiros textos, enviou-me ontem um e-mail dizendo “Navarro, nós temos nosso próprio Madoff!” e anexando uma matéria do jornal Valor Econômico sobre a empresa Agente BR Assessoria, do grupo Agente BR Corretora de Câmbio. Para começar, a empresa teve liquidação decretada em janeiro deste ano pelo Banco Central por não atender aos pedidos de atualização cadastral e registro diante das autoridades.
Promessas de retornos fantásticos e nenhuma informação sobre os produtos eram os trunfos iniciais das conversas entre potenciais clientes e os gestores. E para chegar até lá, só com indicação de amigos. Fica fácil compreender porque os próprios aplicadores estão comparando este caso ao do emblemático, e agora preso, Sr. Madoff: ao que parece, quase tudo era falso, simplesmente como fachada para captar dinheiro em um esquema pirâmide.
A situação
Em julho de 2008, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou deliberação alertando o mercado para o fato de a Agente BR não ser devidamente autorizada a criar e operar clubes de investimento. Ainda segundo a CVM, o profissional responsável pela corretora, Tulio Vinícius Vertullo, não tinha autorização para atuar como administrador de carteira de valores mobiliários. A propósito, experimente acessar o endereço da “corretora” na Internet – www.agentecorretora.com.br – e veja o que acontece.
“A Agente BR, que não era autorizada a oferecer clubes de investimento, atraía clientes com promessa de retorno altíssimo, acima de 10% em alguns meses, em carteiras que levavam os sugestivos nomes de Diamond III ou Fortune II, com aplicações mínimas entre R$ 10 mil e R$ 30 mil. Não havia envio de extratos, o acompanhamento da aplicação era feito no site da própria corretora, que informava a rentabilidade de cada investidor”
(Jornal Valor Econômico – 18/03/2009)
E o dinheiro aplicado?
Os profissionais designados para realizar a liquidação da “corretora” simplesmente não encontram os registros dos clubes ou das operações realizadas com o dinheiro dos clientes. Não havia contabilidade alguma sendo realizada. O Banco Central vai fazer uma convocação aos credores, para que seja estipulado o tamanho da fraude e o volume total de recursos desviados. Só então o processo será enviado ao judiciário.
A reportagem do Valor procurou o representante da Agente BR, que disse que a empresa está negociando com os investidores e que vai pagar a quantia devida no futuro, em quatro parcelas. Sinceramente, fica difícil acreditar que os investidores reaverão todo o dinheiro aplicado e que isto aconteça em um futuro próximo. Infelizmente, neste caso não consigo demonstrar muito otimismo.
Cabe repassar algumas dicas para o caso de você se deparar com uma proposta excepcionalmente boa pela frente:
- Consulte as autoridades. Se a empresa negocia valores mobiliários e títulos, procure pelo registro junto à CVM, BM&F Bovespa e etc. Este caso aqui ilustrado é típico de um golpe: a empresa não tinha autorização da CVM e nenhum de seus clubes estava registrado na BM&F Bovespa;
- Desconfie. Peça documentos que comprovem a estratégia usada pela empresa para os ganhos que oferece. Questione: como são feitas as operações? Quem é o responsável? Em que ações vão investir? Que tipo de operação será realizada? Não se satisfaça com poucas respostas ou apenas suposições;
- Na dúvida, corra! Se o negócio está nebuloso, parece ser uma fraude e você tem apenas a opinião de poucos amigos e uma grande interrogação pairando sobre sua cabeça, prefira ficar de fora. Investigue mais, dedique mais tempo a conhecer e pesquisar sobre a empresa e os negócios. Só invista quando estiver seguro quanto ao que oferecem e ao que a companhia representa.
Nada melhor que encontrar alguns investidores que acreditaram na promessa de retorno rápido feita pela “corretora” para entender o que se passava nas reuniões fechadas que a Agente BR convocava – alguns chegaram a dizer que os retornos prometidos foram da ordem de 25% ao mês. O InfoMoney Fórum tem um tópico dedicado ao assunto Agente BR e traz inúmeras declarações de vítimas da fraude. São mais de 33 páginas assustadoramente reais. Leia e tire suas conclusões. Infelizmente, também temos pelo menos um Madoff operando por aqui. Que seja feita justiça, de preferência rápida e severa como a de lá.
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Conrado Navarro, educador financeiro, formado em Computação com MBA em Finanças e mestrando em Produção, Economia e Finanças pela UNIFEI, é sócio-fundador do Dinheirama. Atingiu sua independência financeira antes dos 30 anos e adora motivar seus amigos e leitores a encarar o mesmo desafio. Ministra cursos de educação financeira e atua como consultor independente.
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