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Carros: o mercado na direção de uma crise?

by Leandro Mattera
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A luz vermelha parece estar acendendo para o mercado de carros novos no Brasil. Nos últimos anos, a venda de veículos cresceu em ritmo acelerado no país, principalmente após as medidas governamentais que sucederam a crise de 2008, levando o Brasil à quarta posição no mercado mundial.

Mas agora a realidade que se desenha é bastante diferente. Por isso, é importante entender os motivos e os prováveis reflexos, até para que você, consumidor consciente, possa tomar melhores decisões.

1. O Histórico

Voltando um pouco no tempo, o governo adotou claramente uma política econômica de intenso estímulo ao consumo. Especificamente no setor automotivo, houve a redução do IPI e o incentivo ao crédito, impulsionado pelas rodadas de quedas de juros promovidas pelo Banco Central.

Esse cenário, contudo, sempre foi nitidamente insustentável, porque não foi baseado em aumento real da renda e da poupança da população. Como se sabe, boa parte desse “boom” foi movida a endividamento. Mas como o nível de endividamento das famílias já está num patamar bastante elevado, vai ficando evidente que o atual modelo caminha para um esgotamento no horizonte.

Como normalmente ocorre em função das intervenções governamentais na economia, houve uma antecipação da demanda e, agora, começam a surgir os ajustes dos desequilíbrios criados.

2. A Realidade no mercado

Realmente estão em curso grandes mudanças. Nos últimos meses, dois dos pilares nos quais foi apoiado o crescimento das vendas começaram a ruir. O primeiro foi o aumento do IPI em janeiro, mas é bom lembrar que esse fator não exerceu um impacto tão significativo como se costuma comentar, considerando que os acréscimos motivados por esse fator não foram tão elevados.

O segundo está relacionado com as restrições e encarecimento do crédito, em grande medida decorrentes dos recentes aumentos na taxa SELIC.

Ocorre que, embora importantes, esses fatores explicam apenas parcialmente os atuais problemas do setor. Como foi dito anteriormente, as famílias já se encontram bastante endividadas e não bastam reduções pontuais nas taxa de juros, como a que o governo está promovendo por meio da Caixa Econômica Federal, para reaquecer as vendas.

Por exemplo, existem muitos modelos que estão sendo vendidos com juros parcialmente subsidiados pelas fabricantes, mas isso não tem surtido um efeito expressivo nas vendas.

Por outro lado, é preciso lembrar também que as marcas têm realizado significativos aumentos de preços. Nesse ponto, há duas situações emblemáticas:

  • No primeiro caso, há veículos que já sofreram mais de três aumentos consecutivos recentemente;
  • Numa segunda situação também bastante visível, nota-se que os lançamentos de novas gerações dos carros estão com preços bem elevados quando comparados com os seus antecessores. Essa situação agrava-se pelo fato de que esses novos veículos não estão sendo equipados da forma que deveriam considerando os patamares de preços onde estão sendo posicionados. São, portanto, caros pelo que oferecem.

Aliás, quando observamos que os preços de alguns carros populares já estão se situando num patamar acima dos R$ 40 mil, torna-se evidente que há algo que merece reflexões.

3. A realidade na indústria automotiva

Dessa forma, a indústria automotiva já dá claros sinais de que está sentindo os efeitos do desaquecimento no mercado interno, realidade que tem sido agravada pela queda nas exportações, principalmente para a Argentina.

Para ilustrar, vale lembrar que, segundo a Anfavea, no primeiro trimestre do ano a produção caiu 8,4%, e já despencou 14,5% na primeira semana de abril.

Por sua vez, os estoques também já estão em níveis elevados. No mês de março, os estoques fecharam na casa dos 48 dias, quando o aceitável seria de aproximadamente 35. Esse patamar é o mais elevado desde 2008.

Nesse contexto, as fabricantes começam a tomar medidas de readequação, principalmente por conta da crescente capacidade ociosa. Por isso, já há inúmeros casos de redução de jornadas e turnos, suspensão de contratos de trabalho, férias coletivas e abertura de Planos de Demissão Voluntária (PDVs).

Agora o aspecto mais preocupante para o setor é que a capacidade produtiva está em ampla expansão no Brasil, inclusive por conta da chegada de novas marcas. Vale lembrar, todavia, que boa parte desse movimento também é resultante de intervenções do governo no mercado, como por exemplo, pelo estabelecimento de quotas de importação e pelo Inovar-Auto.

Adicionalmente, nos últimos anos também ocorreu a elevação no protecionismo econômico, com a criação de barreiras ainda maiores para a importação de carros.

A questão é que o Brasil deverá produzir cerca de 6 milhões de carros por ano até 2017, e é extremamente difícil que o mercado interno tenha condições de absorver essa produção, como reconhecem os envolvidos no setor. Sem um grande ganho de competitividade, principalmente frente ao México, é difícil imaginar que as exportações serão suficientes para equilibrar a situação.

É inegável, também, que os excessos de investimento no parque produtivo também foram apoiados em análises exageradamente otimistas em relação ao nosso mercado. Afinal, não levaram em conta a já mencionada insustentabilidade do modelo de crescimento do mercado nos anos anteriores.

Pelo que tenho percebido, eventuais reversões de planos ainda têm sido raras. A mais evidente foi a desistência, expressa pela Honda, de trazer a sua marca de luxo Acura para o Brasil.

4. As tendências

A queda da demanda por carros novos parece que veio para ficar. Alguns motivos são significativos para apoiar esse visão:

  • Antecipação de demanda já ocorreu e as famílias estão altamente endividadas: fatores já analisados acima;
  • Elevação de preços dos carros novos: aspecto também já comentado;
  • Inflação crescente: como todos têm percebido, os efeitos da alta da inflação estão cada vez mais presentes em todas as áreas da nossa vida. O impacto no bolso das famílias é acentuado e compromete o orçamento familiar, principalmente porque a renda, no geral, não tem acompanhado esse movimento. Com isso, o poder aquisitivo dos consumidores tem diminuído, o que se reflete no mercado automotivo;
  • Consumidores começam a pensar em ficar mais tempo com os carros: como já discuti em artigos anteriores, o brasileiro troca de carro com muita frequência. Agora, no entanto, começo a observar, ao conversar com meus clientes e ouvir comentários em vários meios, que as pessoas estão dispostas a ficar mais tempo com seus carros, principalmente porque estão notando as desvantagens financeiras que as trocas sucessivas acarretam. Se você está pensando dessa forma ou também tem notado esse movimento, por favor deixe seu comentário abaixo;
  • Maior procura por carros usados e seminovos: como já tem sido noticiado, tem crescido o interesse e a venda de carros usados. Evidentemente, o cenário anteriormente descrito acaba levando os consumidores a pensarem com mais atenção nesta opção. No meu trabalho como consultor automotivo pessoal, na Carro e Dinheiro, já noto clientes de várias classes sociais cogitando a compra de usados, muitos deles pela primeira vez em suas vidas.

Conclusão

Nesse cenário de mudanças que impactam diretamente nos hábitos de consumo, creio que serão necessárias significativas mudanças envolvendo os protagonistas do mercado, que são a indústria automotiva e o governo.

Essa conclusão leva em conta o fato de que o atual modelo parece dar sinais de exaustão e meras promoções, incentivos, reduções pontuais de impostos e de taxas de financiamento, provavelmente não surtirão efeitos significativos para promover a retomada sustentável das vendas.

Enquanto isso não ocorre, o melhor que você pode fazer é estar consciente sobre essa realidade para tomar melhores decisões de consumo.

Finalmente, para aprofundar o assunto da melhor forma possível para os leitores, relembro que lançarei em breve o meu livro sobre o tema envolvendo “como escolher um bom carro para comprar, pensando no veículo e nas finanças”.

Complementando o que havia dito no meu artigo anterior, “Carros: o Poder do Consumidor” (clique para ler), o lançamento previsto para abril ocorrerá apenas em maio. O motivo é decorrente de aperfeiçoamentos para deixá-lo ainda mais completo. O lançamento será divulgado aqui no Dinheirama e convido você a ficar atento para as novidades.

PS: Pensando nas pessoas que dão valor ao seu dinheiro e querem escolher bem os seus carros, foi publicado o livro digital Como Escolher o seu Carro Ideal (clique para detalhes), de minha autoria, que apresenta um roteiro completo para a definição de qual carro comprar, de acordo com o perfil de cada consumidor. Convido você a conhecer mais detalhes do livro clicando aqui.

PS 2: Para ajudar você a controlar melhor os gastos crescentes com seu carro no dia a dia, eu também elaborei uma planilha completa e de fácil preenchimento, que pode ser baixada (gratuitamente) no seguinte link: http://bit.ly/PlanilhaCarro

Obrigado pela atenção, um forte abraço e até a próxima.

Foto “Tired business man”, Shutterstock.

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