Renan comenta: “Navarro, seu blog é show, parabéns! Olha só, a venho acompanhando essa crise nas Bolsas, nos Estados Unidos e em todo mundo e confesso: não estou entendendo muita coisa. O negócio é economês demais e na hora pensei em você, o nosso tradutor oficial dessa língua difícil. O que realmente precisamos entender dessa coisa toda? E essa história do Banco Central que injetou dinheiro nos bancos? Como isso tudo vai influenciar a vida de um cidadão comum que investe em fundos e em ações”?
Renan, obrigado pela visita e pelas palavras de apoio. Quanta responsabilidade essa de “traduzir o economês” hein Renan? Como sempre, aceito o desafio e vou tentar explicar a crise em poucas (e fáceis) palavras, usando alguns exemplos bem simples e alguns comentários extraídos de jornais colecionados durante a semana. De todo modo, a crise é importante e influencia muito o ritmo de nossos negócios, especialmente na Bovespa. O mínimo que podemos fazer é entender como isso pode acontecer.
O que é o bendito Subprime?
Todo empréstimo deve ser classificado quanto ao risco inerente ao tomador do dinheiro e sua capacidade de honrar com os débitos. Quando você empresta algum dinheiro, pensa sempre se vai recebê-lo de volta facilmente, certo? O banco e o mercado fazem a mesma coisa. Assim, existem três classes de risco para os empréstimos:
- Prime – Crédito classificado como de primeira linha, dado a pessoas com histórico de bom pagador;
- Subprime – Empréstimo avaliado como de risco maior de entrar em inadimplência por ser concedido a pessoas que não conseguem comprovar capacidade de pagamento, têm histórico de inadimplência ou não são pontuais, entre outros motivos;
- Default – Créditos em atraso com negociação para recuperação
Tá, mas e daí?
E daí que os americanos comuns compraram muitas casas no início da década porque os juros estavam em queda e era uma excelente chance de terem sua casa própria. Mas eles queriam aproveitar o bom momento da economia e decidiram refinanciar suas casas, ou seja, hipotecaram o imóvel e pegaram dinheiro vivo na troca. Esse dinheiro foi gasto no consumo, na economia como um todo. O aumento do fluxo de capital gerou mais linhas de crédito e muitos americanos passaram a fazer a mesma coisa. O número de casas construídas cresceu muito, o crédito para isso ficou mais fácil e o preço do imóvel, obviamente, caiu. Mas em pouco tempo a demanda fez com o que os preços novamente começassem a subir.
Como muita gente acabou renegociando seu imóvel na hora errada (elevados preços), o empréstimo realizado acabava por valer mais que o imóvel hipotecado. Imagine que um americano refinanciou sua casa no valor de US$ 300 mil, saiu com essa grana na mão e agora sua casa vale US$ 250 mil. Ele está devendo US$ 50 mil a mais. A maioria deles acaba entao optando por desistir do pagamento do financiamento e permite que a casa seja tomada pelo banco. Lembre-se que este grupo é o subprime, que já não tinha um bom histórico de pagamento de seus compromissos financeiros.
Os bancos emprestaram dinheiro sem pensar nisso?
Os bancos afrouxaram a análise dos clientes na abertura de crédito, facilitando o acesso ao dinheiro, porque acreditavam na economia e na manutenção dos preços dos imóveis. Sim, deram dinheiro fácil. Do outro lado, muitos investidores compraram recebíveis relacionados a estas hipotecas. A rentabilidade destes fundos está relacionada ao reflexo do pagamento da linha de crédito subprime. Muito risco, muito retorno. Mas deu errado, o banco hoje tem menos dinheiro que o necessário para ressarcir esses investidores, porque micou com hipotecas sem valor.
Problema de liquidez
Percebendo o problema, muitos investidores decidiram sacar o dinheiro destes fundos imobiliários que aplicavam em CDO – opção financeira que aplica em imóveis nos EUA. O banco não tem, em caixa, o dinheiro disponível para que tanta gente possa sacar seus montantes. Surge a chamada crise de liquidez. São duas as saídas: ou os bancos bloqueiam o saque, como fez o francês BNP Paribas, ou tomam dinheiro emprestado do Banco Central, como fizeram alguns bancos nos EUA e Europa. Ambas as saídas demonstram que há um problema com o fluxo de capital.
Mas isso começou nos EUA. O que a Europa e o mundo têm a ver com isso?
Os bancos internacionais aplicam em diversos produtos do mercado americano. Fundos daqui e da Europa também têm posições nestes fundos imobiliários. Se os cotistas de lá correram para salvar seu dinheiro, o mesmo aconteceu na Europa e no mundo. As cotações das Bolsas internacionais caem porque os bancos, tendo que honrar seus compromissos com estes cotistas, vendem diversas ações. Além disso, o temor de que a crise persista faz com que investidores prefiram aguardar o desfecho de tudo para então voltar a negociar ações. Eles vendem, ainda que barato, e ficam de fora.
Ufa. Acho que entendi.
Tudo tem explicação. Em economia também é assim. A diferença são as consequências. Existem algumas outras variáveis que influenciam esse atual problema (enfraquecimento do dólar, déficit fiscal e de conta corrente nos EUA etc), mas prefiro deixar apenas este texto introdutório sobre a questão. Vamos debater o tema? Publiquem suas dúvidas e mais eplixações sobre na área de comentários ou entrem em contato direto comigo. Espero que todo o cenário possa agora parecer mais claro, embora não menos perigoso.