O governo Luiz Inácio Lula da Silva projetou nesta sexta-feira que fechará 2024 com déficit primário de 9,3 bilhões de reais, dentro da margem de tolerância estabelecida pelo arcabouço fiscal, apesar de ter feito cortes significativos nas previsões de ganho com medidas arrecadatórias aprovadas pelo Congresso.
Mesmo com o enquadramento em relação à meta, os cálculos da pasta apontam que as contas do ano devem superar o limite de gastos em 2,9 bilhões de reais. Para compensar o excesso, o governo precisará bloquear valor equivalente em verbas discricionárias, o que poderá atingir investimentos.
A sobra de gastos se deve a um aumento de 6,1 bilhões de reais na previsão de despesas obrigatórias, com elevação de custos na previdência social, valor que não foi totalmente compensado por uma estimativa de 4,5 bilhões de reais a menos em desembolsos discricionários.
Apresentada no relatório bimestral de receitas e despesas, a estimativa para o resultado primário ficou pior do que o previsto no Orçamento, de um superávit de 9,1 bilhões de reais, segundo o Ministério do Planejamento. A meta fiscal estabelecida para o ano é de déficit zero, com uma banda de tolerância de 0,25% do PIB, ou cerca de 29 bilhões de reais.
Segundo os cálculos oficiais, a receita líquida do governo, que exclui transferência a Estados e municípios, deve ficar 16,8 bilhões de reais menor do que o estimado no Orçamento, a 2,175 trilhões de reais.
Nessa área, o governo cortou o impacto previsto neste ano da medida que mudou regras sobre subvenções a empresas de 35,3 bilhões de reais para 25,8 bilhões de reais, enquanto a alteração no mecanismo de Juros sobre Capital Próprio (JCP) teve ganho reduzido de 10 bilhões de reais para zero.
Os dados mostram ainda que a equipe econômica também zerou a previsão de receita com a tributação de produtos importados de baixo valor no programa Remessa Conforme, ante projeção original de 2,9 bilhões de reais.
Cautela
Em conversa com jornalistas em São Paulo, Haddad citou a alteração do conteúdo de medidas durante a tramitação no Congresso e atribuiu os cortes nas projeções à necessidade de cautela.
“Quando você revê para baixo, você está sendo mais cauteloso, você está aproximando mais daquilo que você imagina que vai performar, é uma medida de responsabilidade fazer isso”, disse.
Ainda do lado da arrecadação, a projeção oficial aponta que a coleta de impostos pela Receita Federal deve ficar 17,7 bilhões de reais abaixo do previsto no Orçamento. Nas contas não administradas pelo fisco, a perda é estimada em 27,3 bilhões de reais nas rubricas de concessões públicas e exploração de recursos naturais.
Mesmo com a expectativa de arrecadação menor em diversas frentes, o governo prevê uma alta de arrecadação total de 168,3 bilhões de reais neste ano em relação a 2023, valor muito próximo ao previsto originalmente no Orçamento.
O efeito quase nulo nas contas se deve a ganhos previstos em outras áreas. Entre os pontos, está a limitação de compensações tributária de empresas, que deve gerar um incremento de 24 bilhões de reais no ano. A iniciativa, editada pelo governo em medida provisória, ainda não foi aprovada pelo Congresso.
Em relação às despesas totais, a previsão do governo é de uma alta de 1,6 bilhão de reais, atingindo 2,185 trilhões de reais.
No geral, a nova projeção para o resultado primário ficou muito acima das estimativas feitas até mesmo dentro do governo nos últimos meses. A própria equipe econômica chegou a fazer uma interpretação do arcabouço fiscal para defender que possíveis contingenciamentos de verba para respeitar a meta fossem limitados a 23 bilhões de reais — valor que analistas consideravam menor que o necessário para assegurar o déficit zero.
O número apresentado nesta sexta pode dar força para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, resistir à pressão de parte do governo para revisar a meta fiscal de forma a dar mais espaço para investimentos, como defendia parte do primeiro escalão e, em certo momento, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nos dois primeiros meses do ano, a arrecadação do governo veio acima do esperado e registrou recordes, o que evitou a necessidade de um contingenciamento para assegurar o cumprimento da meta fiscal.
No entanto, como as despesas surpreenderam para cima, especialmente os gastos previdenciários, será necessário o bloqueio de 2,9 bilhões de reais, dado antecipado pela Reuters. O detalhamento do corte por ministério será apresentado até o fim do mês.
Pelo arcabouço fiscal aprovado no ano passado, as despesas do governo podem crescer a um ritmo de 70% da variação da arrecadação, sendo limitadas a uma alta real anual de 0,6% a 2,5%.