O diretor de assuntos internacionais do Banco Central, Paulo Picchetti, disse em entrevista ao Estadão/Broadcast que a mudança na orientação futura da autarquia pode permitir que o Comitê de Política Monetária (Copom) vá “mais devagar para chegar mais longe” no afrouxamento monetário.
Segundo ele, a decisão de tirar o “forward guidance” que indicava cortes de 0,50 ponto percentual na Selic nas próximas duas reuniões foi tomada com o objetivo de ganhar liberdade para acompanhar os dados.
“Eventualmente ter uma flexibilidade com relação à trajetória futura é algo que ajuda uma taxa terminal menor ser possível”, afirmou ele na entrevista, publicada nesta quinta-feira no site do jornal.
“Se houver oportunidade de ter calma, de mudar a trajetória de alguma forma que te faça ganhar tempo para ter novos dados e avaliar melhor a situação, ajuda as expectativas a convergirem de um jeito que possibilita no final, eventualmente… Ir mais devagar para chegar mais longe.”
No entanto, Picchetti ponderou que ninguém no Copom tem clareza sobre se será necessário, de fato, reduzir o ritmo de afrouxamento monetário.
“Quando se levanta que talvez seja necessário, é porque acenderam sinais amarelos que só vão se transformar em decisões se ao longo do tempo ficar evidente que estão criando uma trajetória que comprometa a inflação corrente e as expectativas. Não temos ainda essa evidência, mas temos tempo para que novas informações surjam”, afirmou o diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos.
O Banco Central decidiu no mês passado fazer uma sexta redução consecutiva de 0,50 ponto percentual na taxa Selic, a 10,75% ao ano, e encurtou sua indicação sobre cortes futuros ao citar uma ampliação de incertezas, afirmando que sua diretoria antevê corte na mesma intensidade apenas na próxima reunião, em maio.
Anteriormente, a orientação sugeria reduções da mesma magnitude nas “próximas reuniões”, no plural.
“O guidance não é um compromisso firme, mas é algo com mais peso. Teve um papel importante no início do ciclo de cortes, reduziu a volatilidade e ajudou a comunicação, mas tem um custo na hora de tirar”, disse Picchetti na entrevista.
Sobre as expectativas de inflação desancoradas com o boletim Focus apontando alta de 3,50% do IPCA em 2026 e 2027, acima do centro da meta, de 3% o diretor afirmou que parte do prêmio nessas projeções está relacionada a temores fiscais, mas que isso pode melhorar à frente.
“As notícias são mais animadoras pelo arcabouço e pelas notícias de curto prazo que estão surpreendendo, o que já leva até a um princípio de revisão do déficit primário para este ano. Tudo isso em um contexto de um ministro (da Fazenda, Fernando Haddad) incrivelmente comprometido com a meta zero. Se isso é verdade, ao longo do tempo ajudará a tirar esse prêmio.”
Questionado pelo Estadão sobre se um fiscal mais positivo é consenso dentro do Copom, Picchetti respondeu afirmativamente.
Sobre a transição de liderança do BC, conforme o mandato do atual presidente Roberto Campos Neto vai se aproximando da reta final, Picchetti disse que “não há evidências de que eu ou outra pessoa qualquer seria um nome da sucessão”.
Atualmente, o nome do diretor de política monetária do BC e ex-braço direito de Haddad no Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, é visto como um dos mais cotados para ser indicado a presidente do BC após a saída de Campos Neto, prevista para o final de dezembro, mas outros, como o próprio Picchetti, também estão sendo apontados como possibilidade.