Renata comenta: “Navarro, tenho acessado seu blog diariamente e adoro seus artigos. Tomara que possa ler meu e-mail e respondê-lo. Pra todo lado existem economistas, ministros e pessoas falando que o Brasil vai bem e que vai ficar melhor porque caminhamos para o grau de investimento. Bom, entendi que isso é algum tipo de reconhecimento, mas queria conhecer melhor suas características e esta forte de vontade de caminhar para “lá”. Parabéns pelo blog”.
Renata, obrigado pelas visitas sempre pontuais. Adorei seu comentário e o tema proposto, que é bastante gostoso de discutir. Você está certa quando diz que todos por ai estão eufóricos com o tal grau de investimento e espero que possa ajudá-la a entender a razão de tanta felicidade. De uma forma simples, o grau de investimento é um reconhecimento internacional, dado em forma de nota (sim, como as notas da escola), que sinaliza que o país teve seus fundamentos sócio-econômicos melhorados e que há preocupação em honrar credores nacionais e internacionais.
Reconhecimento dado em forma de notas? Como assim notas?
Isso mesmo, notas! A coisa funciona de maneira simples. As agências internacionais de classificação usam notas para identificar e sinalizar o risco de investimento em empresas e países. Assim fica fácil para que fundos e gestores internacionais possam conhecer a empresa e suas características econômicas e de estrutura de capital. Cada agência utiliza seu próprio formato, mas em resumo seu controle é parecido: elas atribuem notas altas para empresas e países mais seguros e notas baixas para empresas e países mais arriscados. São muitas as agências (Moody’s, S&P, Fitch etc) e fica difícil exemplificar todas. Notas altas, por exemplo, seriam AAA, AA+, BB+, BBB-. Notas baixas, B, C, D.
No nosso caso, a Moody’s classifica o Brasil como Ba2, ou seja, país ainda abaixo da média de confiabilidade para dívidas de longo prazo. O próximo passo é entrar na média, indo para Baa, recebendo o grau de investimento. Para a agência Fitch, o Brasil possui nota BB+. No caso da Standard & Poor’s, nossa nota também é BB+, sendo o próximo passo a nota BBB, que já representa o grau de investimento. Ficou claro? O grau não passa de uma nota, que varia de agência para agência. Mas uma nota que vale uma nota.
Como as empresas avaliam o país? Quais as variáveis principais?
Eu diria que são dois os pontos macroeconômicos principais: taxa real de juros e a enorme carga tributária. A explicação para tais pontos é bastante óbvia:
Taxa real de juros: o Brasil é o país com mais alta de juros reais e isso prejudica o financiamento da dívida pública.
Excessiva carga tributária: próxima de 40% do PIB, a carga tributária prejudica os investimentos e as exportaçõe, uma vez que fica “caro” agregar valor por aqui.
Portanto, as agências visam entender se o país oferecerá vantagens para investidores, nacionais e internacionais, de forma a proteger seu capital e criar um cenário de desenvolvimento para indústrias e para o consumidor local. O Brasil está quase lá, especialmente porque vem trabalhando forte na redução da taxa básica de juros. No entanto, ainda falta muito esforço para melhorar a carga tributária.
De novo, esta é uma explicação simples e básica, de forma que todos possam compreender o que se passa por trás de tanto “economiquês”. Existem variáveis mais complexas, como valorização da moeda, relação entre dívida e PIB etc, mas paro por aqui porque nem eu as entendo tão bem.
Podemos tirar proveito desta euforia pelo grau de investimento?
A turma que anda investindo em ações já está aproveitando esta onda. Segundo um estudo realizado pela GAS Investimentos, que foi publicado no jornal Valor Econômico, as bolsas de valores de quatro países (Coréia, México, Rússia e Índia) subiram, em média, 32% a mais que a média das bolsas dos demais países emergentes. Até ai tudo bem, mas o interessante é que este retorno ocorreu num período de 24 meses – 12 meses antes do grau de investimento e 12 meses depois.
As previsões para o Brasil anunciam que o grau de investimento chegará em 2008, no primeiro semestre. E notamos que a Bovespa já acumula alta de 22,59% desde janeiro. Parece que o movimento já começou e já tem muita gente surfando esta onda. Mas cuidado, a onda é para quem sabe surfar. Mas lembre-se de que antes de aprender a surfar, é preciso saber nadar. Não adianta sair comprando ações simplesmente porque o grau de investimento “se aproxima”. Cautela nunca é demais e o objetivo do artigo não é pedir que você se aventure nestas águas turbulentas. Quero apenas desmistificar o grau de investimento.
Deixa eu ver se entendi. O país se beneficia do capital estrangeiro, cresce mais e fortalece suas instituições?
É isso ai. E o grau de investimento irá sinalizar aos grandes investidores internacionais (fundos, gestores independentes, pessoas etc) que o Brasil é um bom pagador de suas dívidas, que sua economia caminha de forma consistente e que seu desenvolvimento, e de seus habitantes, é prioridade constante do Governo. Sinalizar o risco é o grande objetivo das agências.
E depois?
Bom, o amanhã é o que todos nós gostaríamos sempre de saber. Com o grau de investimento, o país terá melhor poder de negociação no mercado internacional, conseguirá taxas mais atrativas para empréstimos e oferecerá uma estrutura financeira mais interessante aos empresários nacionais e internacionais. Isso é o que todos esperam e o que vem acontecendo com países recentemente “presenteados” com o grau de investimento. Na prática, isso significa taxas de juros menores, inflação menor, estabilidade da moeda e um mercado de capitais ainda mais consolidado.
E se…
Pois é, somos o país do “e se”. Se tudo que falei pode ir por água abaixo? Pode, mas para isso seria necessário bastante “empenho” de nossas autoridades. Se temos loucos em quantidade suficiente para mudar este cenário e empregar o tal “empenho”? Sim, temos e muitos deles muito mais bem posicionados do que você imagina. Se temos chance de dar certo como nação? Sim, temos.
Mas aprendi, com um professor de Macroeconomia, que certas vezes precisamos parar e analisar um cenário pior: você já parou para pensar que o Brasil pode não dar certo? E ai? Bom, ai a primeira coisa que veremos será o rebaixamento de nossa nota e a perda do grau de investimento. Daí pra frente (ou pra trás), você já sabe.