O setor de construção no Brasil deve ter alta significativa na demanda por trabalhadores a partir do segundo semestre, com o impulso de novos projetos orçados pelo governo para 2024, disse o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), Renato Correia.
“A gente já está vivenciando essa dificuldade de contratação de mão de obra há algum tempo e o incremento de mais recursos, seja na infraestrutura ou na própria habitação, nos traz uma preocupação” com relação à escassez de trabalhadores, afirmou Correia em entrevista à Reuters.
Com uma agenda de investimentos robustos planejados para os próximos anos, especialmente nos setores de habitação e infraestrutura, “a partir do segundo semestre, acho que já podemos ter um pouco mais de pressão (de mão de obra)”, disse.
As construtoras têm se preparado para um cenário de maior demanda por trabalhadores, capacitando funcionários, antecipando contratações, mirando a industrialização e até mesmo incentivando maior ingresso de mulheres no setor.
De acordo com dados mais recentes do Caged, o setor da construção encerrou novembro com 2,66 milhões de trabalhadores com carteira assinada. Correia estima que esse número possa chegar a 3 milhões entre o fim deste ano e início de 2025.
Para a estimativa, o presidente da Cbic considerou o incremento de 30% nos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), previsto no orçamento de 2024, uma reserva de 13,7 bilhões de reais para a faixa 1 do programa habitacional Minha Casa Minha Vida e os investimentos para obras de infraestrutura do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
“É uma expectativa possível… nós já chegamos a 3,7 milhões (de trabalhadores) em 2011, 2012, aproximadamente”, disse Correia. “A gente entende que é um teto possível de se atingir mais para o final de 2024, início de 2025, porque a aplicação desse recurso também não acontece de imediato agora no início do ano.”
O Conselho Curador do FGTS aprovou um orçamento de 117,65 bilhões de reais para políticas públicas de habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana em 2024, mantendo esse orçamento para 2025, 2026 e 2027, em comparação com os 96,96 bilhões de reais do ano anterior.
A diretriz a ser seguida pelo setor envolve agora buscar mais mecanização, a inserção de novos funcionários no mercado, como o público feminino, e transformar “um serviço pesado em um serviço mais leve” por meio da industrialização, disse Correia.
“Com isso a gente (pode) melhorar até a questão da remuneração e atrair mais entrantes, para que no futuro a gente não sofra mais ainda com a questão da falta de mão de obra.”
Estado de São Paulo em foco
O presidente-executivo da Direcional (DIRR3), Ricardo Gontijo, destacou desafios maiores no Estado de São Paulo, especialmente na capital paulista e região metropolitana, em comparação com outras regiões onde ainda não foram identificados sinais de aperto na oferta de profissionais.
“No restante do Brasil… a gente está bem tranquilo”, disse Gontijo. A Direcional atua nas regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste.
Para Yorki Estefan, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo, a preocupação é “real” e considera que o atual volume de mão de obra é insuficiente para atender à demanda futura.
Ambos disseram ter observado desde o ano passado sinais de uma oferta mais restrita no setor, e Gontijo acrescentou que tem antecipado contratações na empresa para lidar com um eventual aperto no mercado.
“Eu diria que, talvez, esse maior cenário de começar a ter um certo cuidado em antecipar as contratações de mão de obra, especialmente na região metropolitana de São Paulo, tenha se iniciado nos últimos 8 a 12 meses.”
O presidente do SindusCon-SP afirmou que essa perspectiva tem reflexo também na maior atenção que a habitação tem recebido das esferas municipal e estadual de São Paulo, como os programas “Casa Paulista” e “Pode Entrar”.
A Patriani, construtora de médio e alto padrão atuante no Estado de São Paulo, também está atenta à dinâmica do mercado de trabalho na região.
“O que a gente entendeu? Que o primeiro passo era internalizarmos, mesmo que parcialmente, parte dessa mão de obra, e até pensando na possibilidade de inserirmos mulheres dentro dos nossos canteiros”, disse a superintendente de recursos humanos da construtora, Juliana Quintino.
A Plano & Plano, ex-joint venture da Cyrela, tem procurado fidelizar fornecedores e planejar antecipadamente os lançamentos, segundo a diretora de incorporação, Renée Silveira.
“Nós mesmos já estamos trabalhando e desenvolvendo algumas equipes internas para caso um empreiteiro não possa nos atender dentro dessa ‘loucura’, a gente consegue atender.”
A diretora ainda destacou que construtoras de médio e alto padrão têm se “arriscado” no segmento econômico na esteira das novas regras para destravar o MCMV. “Isso vai dar uma balançada agora em 2024, com toda certeza.”
Tanto ela quanto Gontijo, da Direcional, disseram que uma procura menor no médio padrão, devido às altas taxas de juros, manteve o mercado mais controlado até agora. O governo federal estuda ampliar a faixa de renda elegível para o MCMV para 12 mil reais, o que abrangeria a parte mais baixa desse segmento.