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Expresso Renda Fixa: Os ventos contrários que nos fazem navegar à bolina atualmente

Como você deve imaginar, gasta-se muito mais tempo e trabalho para navegar à bolina do que quando o vento está a favor da embarcação

by Guilherme Cadonhotto
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Você já pensou como é possível velejar contra o vento?

Sim, isso pode ser feito, porém, não é nada fácil. A essa técnica dá-se o nome de navegar à bolina ou bolinar.

Como você deve imaginar, gasta-se muito mais tempo e trabalho para navegar à bolina do que quando o vento está a favor da embarcação.

É importante que você entenda que navegar em uma linha reta contra o vento não é possível, mas, sim, na sua diagonal, em um ângulo próximo a 45 graus.

Sim, se você navegar por muito tempo a 45 graus de seu destino, você se afastará bastante de seu objetivo final. Então, o que fazer?

Após um tempo, a embarcação precisa ser guiada para o lado oposto, mas tendo como referência novamente a angulação de 45 graus em relação à direção direta do vento.

Essa alternância de direção durante o trajeto para atingir o objetivo final vai traçar uma trajetória que chamamos de zigue-zague, como na imagem abaixo:

Fonte: Salvador Náutico

Na minha opinião, podemos afirmar que atualmente o mercado brasileiro navega à bolina, e eu vou explicar o motivo.

De fato, a direção que estamos tomando é favorável, e isso é determinado pela queda da taxa Selic. Historicamente, quando esse movimento acontece, os ativos de risco tendem a apresentar uma valorização relevante e é provável que desta vez não seja diferente.

Ventos contrários

O que estamos enfrentando no atual ciclo, porém, é algo diferente do anterior, o que podemos chamar de ventos contrários.

Para mim, são dois os principais ventos contrários a essa trajetória mais positiva: os juros nos Estados Unidos e a nossa credibilidade fiscal.

Vamos começar pelo último. Em 2016, quando iniciamos o ciclo de corte de juros anterior, a dívida pública estava em aproximadamente 70% do PIB, e a expectativa era que se estabilizasse em um patamar perto de 75% do produto interno bruto.

Os esforços naquele momento eram de equilíbrio das contas públicas, e a sinalização vinda tanto do governo federal quanto do Congresso caminhavam para essa direção. 

Com indicações de maior equilíbrio nas contas públicas, é normal que os juros de longo prazo cedam, afinal, essa é a taxa exigida pelos credores da dívida brasileira, e quanto maior equilíbrio indicado no orçamento, menor essa porcentagem se torna.

No início de 2016, momento em que a preocupação fiscal ainda estava elevada, as taxas de juros de longo prazo estavam próximas a 17% contra uma Selic em 14% ao ano, indicando uma contínua alta dos juros básicos do país e implicando também em um custo de financiamento da dívida pública caríssimo.

Ao final daquele ano, com as medidas adotadas e a sinalização passada em busca do equilíbrio das contas públicas, a taxa de juros de longo prazo cedeu para patamares próximos de 12% – e tudo isso em menos de um ano.

Atualmente, o cenário ainda é incerto, não tão ruim quanto no fim de 2015, mas não positivo quanto no término do ano seguinte.

Isso porque a dívida pública está perto de 75% do PIB hoje e a expectativa é que continue subindo até 90% do PIB em meados de 2030, patamar em que se espera uma estabilização.

Veja, vamos sair de um ponto de partida pior do que em 2016, com uma dívida pública já em 75% do PIB, e em uma trajetória esperada menos favorável do que naquele momento. 

Esse talvez seja um vento razoavelmente forte contra a melhora do mercado brasileiro.

De novo, é possível velejar contra o vento? Sim, mas demora-se em média quatro vezes mais.

Ela disse que a principal questão para o banco central é decidir quão restritiva a política monetária (Imagem: REUTERS/Jason Reed)
Os últimos dados de atividade da economia norte-americana, principalmente indicadores de emprego, estão mostrando um desaquecimento relevante no mercado de trabalho (Imagem: REUTERS/Jason Reed)

EUA

O outro vento que sopra contra a “embarcação” brasileira são os juros norte-americanos.

Em 2016, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, havia começado a elevar sua taxa, que saiu de zero para 0,50% a.a. no fechamento daquele ano. Já a Selic encerrou o ano em 13,75% a.a., um diferencial de 13,25 p.p., um patamar muito acima da média histórica, o que permitia que os juros aqui continuassem caindo sem uma pressão relevante no câmbio.

Atualmente, a taxa de juros por lá está em 5,50% a.a., com expectativa para mais uma alta, enquanto a Selic está em 13,25% ao ano. Apesar de a diferença ainda ser relevante, vale dizer que ela já está abaixo da média histórica, o que não dá tanto espaço para que o nosso Banco Central corte os juros sem que isso pressione o câmbio e, consequentemente, a inflação.

Mas esse vento de proa pode arrefecer.

Os últimos dados de atividade da economia norte-americana, principalmente indicadores de emprego, estão mostrando um desaquecimento relevante no mercado de trabalho, que pode retirar o ímpeto de juros mais altos na maior economia do mundo e, por tabela, trazer alívio e espaço para que os juros futuros no Brasil continuem apresentando queda.

Portanto, lembre-se de que em 2016 o cenário era diferente: a tendência positiva marcada pela Selic em queda era acompanhada de ventos em popa de dois lados, com indicativos positivos do âmbito fiscal e juros baixos nos EUA (mesmo em movimento de alta).

O cenário hoje é diferente, o que deve amenizar a velocidade e a intensidade dos ganhos. Resta a nós, investidores, navegar nossos barcos (isto é, as carteiras) à bolina, sem querer realizar movimentos arriscados que coloquem o patrimônio em risco, até que os ventos voltem a ficar favoráveis.

Abraços,

Guilherme Cadonhotto

Especialista em renda fixa e estrategista-chefe da Spiti. Técnico em Administração de Empresas e bacharel em Economia, atuou na mesa de operações como trader de renda fixa na SulAmérica Investimentos e como analista de investimentos na asset da Porto Seguro.

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